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DA RESTRIÇÃO À REDENÇÃO: A Trajetória Feminina no Processo Eleitoral

DA RESTRIÇÃO À REDENÇÃO: A Trajetória Feminina no Processo Eleitoral

No presente estudo, buscamos analisar os múltiplos aspectos que envolvem a presença feminina na política e a persistência de uma realidade de sub-representação das mulheres que persiste até os dias atuais. A partir de uma perspectiva histórica, é possível observar como as questões que permeiam este processo são parte de uma estrutura social mais ampla, profundamente moldada por uma sociedade construída e controlada por homens. Esta estrutura patriarcal não apenas configurou a dinâmica política, mas também influenciou as esferas econômica, social e cultural, perpetuando a exclusão das mulheres dos espaços de poder e decisão. A presença feminina em posições de poder e na tomada de decisões sempre foi recebida com desconfiança, sendo percebida como uma ameaça à ordem social estabelecida e aos papéis de gênero tradicionalmente definidos. Esta desconfiança se manifestou de diversas maneiras, desde a negação de direitos básicos até a implementação de políticas e práticas que limitam a participação das mulheres na política.

Este cenário de sub-representação evidencia uma desproporcionalidade marcante entre a sociedade e a representação política, além de uma evidente desigualdade de gênero nesses espaços. Diante desta realidade, é indispensável a criação e implementação de políticas que visem reduzir este abismo, promovendo a inclusão e a participação efetiva das mulheres nos debates e processos políticos, tornando-os mais justos e representativos.

Após 92 anos da conquista do sufrágio feminino, a realidade das mulheres na política ainda é permeada por desafios, barreiras e resistência. Embora atualmente as mulheres representem 51,1% da população brasileira, correspondente a quase 105 milhões de pessoas, sua presença nos espaços de poder é significativamente inferior à masculina. No Congresso Nacional apenas 17,7% das cadeiras são ocupadas por deputadas e senadoras, 12% das prefeituras são administradas por mulheres e, entre as 27 unidades federativas brasileiras, apenas duas são governadas por mulheres. Este cenário de sub-representação evidencia uma desproporcionalidade marcante entre a sociedade e a representação política, além de uma evidente desigualdade de gênero nesses espaços. Diante desta realidade, é indispensável a criação e implementação de políticas que visem reduzir este abismo, promovendo a inclusão e a participação efetiva das mulheres nos debates e processos políticos, tornando-os mais justos e representativos.

Para além da presença escassa de mulheres na política, as poucas que conseguem adentrar esse espaço ainda são frequentemente expostas à violência política de gênero, sendo vítimas de perseguição, ameaças e intimidações diversas, o que as impede de exercer plenamente suas funções públicas. De acordo com os dados mais recentes do Ministério Público Federal (MPF), desde 2021 – quando entrou em vigor a lei que considera a violência política de gênero um crime – foram registrados 215 casos em todo o país, o que corresponde a uma média de seis casos por mês. Esses números revelam não apenas a persistência de atitudes machistas e discriminatórias, mas também a necessidade urgente de ações que protejam e garantam a integridade e segurança das mulheres que se dedicam à vida pública.

A partir das legislações analisadas ao longo deste trabalho, observa-se o crescente empenho do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) nas questões de gênero e na promoção da representatividade feminina na política. Reconhecendo a explícita e persistente desigualdade entre homens e mulheres nos espaços de poder, bem como a histórica dificuldade da população feminina em ocupar essas posições, o TSE tem se dedicado a implementar medidas que buscam promover uma maior paridade entre os gêneros na esfera política. Essas ações visam garantir e incentivar candidaturas femininas, além de proteger a integridade das mulheres politicamente expostas. Desde as cotas de gênero estabelecidas em 1996 até as mais recentes leis de reserva de recursos e combate à violência política de gênero, essas iniciativas são de grande importância e representam uma preocupação institucional com um ambiente político mais igualitário e seguro para mulheres. Além disso, este movimento também ilumina uma pauta de extrema relevância para o exercício democrático, frequentemente invisibilizada ou simplesmente negligenciada.

É relevante também destacar as iniciativas do TSE no combate às fraudes relacionadas às cotas de gênero, utilizando instrumentos legais para aplicar sanções a partidos e candidatos que forem identificados como responsáveis por tais práticas. Este empenho tem sido essencial para coibir as lamentavelmente numerosas tentativas de burlar as novas medidas estabelecidas no Código Eleitoral. Embora os números ainda permaneçam reduzidos, a presença de mulheres na política registrou um aumento desde a implementação das recentes legislações. Em 2022, houve um recorde de candidaturas femininas, representando 33,3% de todos os candidatos nas esferas federal, estadual e distrital. Também se observou um percentual pequeno no Senado Federal de apenas 17,28% das cadeiras no Senado.

Apesar de os números ainda serem baixos e desproporcionais, esse crescimento reflete os efeitos positivos de medidas institucionais voltadas ao combate da desigualdade de gênero.

No entanto, é necessário reconhecer que, embora as medidas legais sejam extremamente necessárias e tenham demonstrado impactos positivos para a presença feminina na política, elas sozinhas não são suficientes para lidar com uma estrutura historicamente estabelecida. O afastamento das mulheres da política é um problema estrutural, enraizado em visões machistas que persistem ao longo das décadas e perpetuam concepções reduzidas sobre o papel social da mulher, posicionando-a como inadequada para o jogo político, que é visto como compatível exclusivamente com características consideradas masculinas. Portanto, é crucial entender que o combate à desigualdade de gênero na política também requer a luta contra a desigualdade de gênero na sociedade como um todo, através da desconstrução de preconceitos sobre as mulheres e suas capacidades.

A desconstrução e mitigação de padrões de gênero é um processo contínuo, que mantém em evidência a perspectiva de gênero na sociedade e suas nuances. Promover debates abertos e plurais em diversos espaços é crucial. Reconhecer a importância das pautas femininas e garantir a presença das mulheres em espaços de poder fortalece a democracia, representando a diversidade da população. Valorizar e entender a singularidade da mulher e suas vivências enriquece o debate democrático, contribuindo para uma visão mais multifacetada e realista da sociedade. Essa abordagem contrasta com a visão unidimensional e carregada de preconceitos que distorce a realidade, promovendo uma compreensão mais completa e inclusiva.

Diante deste cenário, é possível constatar que o TSE tem adotado uma postura comprometida com a redução da desigualdade entre homens e mulheres na política, colocando a questão de gênero no centro do debate e reconhecendo o problema histórico da sub-representação feminina. Embora o problema persista de forma marcante e intensa, representando um desafio significativo na política brasileira, as novas legislações são medidas de extrema importância ao utilizar instrumentos legais para corrigir uma exclusão histórica que não condiz com a composição da população e do eleitorado brasileiro. No entanto, é fundamental reconhecer que serão necessárias muitas ações adicionais, não apenas através de medidas legais, mas também culturais e educacionais, para promover uma mudança mais ampla e efetiva. Assim, as iniciativas do Tribunal Superior Eleitoral representam um importante ponto de partida para um esforço coletivo que conduza a democracia brasileira a um estágio de maior paridade, justiça e representatividade.

 

Artigo escrito por Fernando Vinicius Souza Rodrigues – Aluno Ebradi do curso Direito Eleitoral

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