A prática de exigir uma garantia financeira antecedente ao devido atendimento médico-hospitalar emergencial é muito recorrente em nosso país. Os hospitais que exigem o chamado cheque-caução para atender os beneficiários de planos de saúde, corriqueiramente, estão na mira do Ministério Público.
Especificamente acerca da exigência de cheque-caução na relação hospital-paciente, nosso atual Código Penal (CP), em razão da publicação da Lei nº 12.653, tipifica como crime a conduta de “exigir cheque-caução, nota promissória ou qualquer garantia, bem como o preenchimento prévio de formulários administrativos, como condição para o atendimento médico-hospitalar emergencial”.
Tal conduta é definida como “condicionamento de atendimento médico-hospitalar emergencial”. A sanção para essa conduta é detenção, de 3 (três) meses a 1 (um) ano, e multa; podendo ser aumentada até o dobro se da negativa de atendimento resulta lesão corporal de natureza grave, e até o triplo se resulta a morte.
O Código de Defesa do Consumidor (CDC) também condena a cobrança desse tipo de garantia. De acordo com o artigo 39, a exigência da garantia para o atendimento é considerada prática abusiva que expõe o consumidor a desvantagem exagerada, causando desequilíbrio na relação contratual.
A cobrança antecipada é proibida, mas como a Lei é muito antiga ela foi praticamente esquecida e, por isso, nem sempre é cumprida. Para não restar qualquer dúvida, a Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), por meio da publicação da Resolução Normativa nº 44, de 24 de julho de 2003, também repudia esse ato.
Vejamos:
Art. 1º Fica vedada, em qualquer situação, a exigência, por parte dos prestadores de serviços contratados, credenciados, cooperados ou referenciados das Operadoras de Planos de Assistência à Saúde e Seguradoras Especializadas em Saúde, de caução, depósito de qualquer natureza, nota promissória ou quaisquer outros títulos de crédito, no ato ou anteriormente à prestação do serviço.
Em decisão recente proferida pela 3ª turma do Superior Tribunal de Justiça, a ministra Nancy Andrighi, relatora do recurso, ao abordar o tema do dano moral nas relações privadas de Saúde Suplementar, consignou que tais relações têm “despertado novos olhares na comunidade jurídica”.
A ministra entendeu que a exigência de cheque-caução para o pagamento de despesas hospitalares não previstas no contrato de plano de saúde não gera, por si só, danos morais. O entendimento da turma foi proferido ao julgar recurso de autores que ajuizaram ação pedindo R$ 6 mil de danos morais.
Para os recorrentes, a cobrança foi abusiva por exigir pagamento prévio em situação de fragilidade emocional. O hospital, por sua vez, reputou lícita sua conduta especialmente por ter prestado o serviço solicitado.
Contudo, a própria ministra salientou que não existe uma tese predefinida que possa ser replicada aos demais casos. Este assunto merece muita atenção e cada conflito levado ao Poder Judiciário deve ser analisado de acordo com as suas especificidades.
Por fim, importante frisar que a posição doutrinária unânime aponta ser consumado o crime com a simples exigência, com o que no presente se concorda, isto é, o simples fato da exigência do cheque-caução já permite a consumação do tipo penal previsto no artigo 135-A do CP.